sexta-feira, 4 de março de 2011

Cuidado com a INTERPRETAÇÃO BÍBLICA! parte 2

Se cada texto do Sagrado Livro possui apenas um único sentido, como descobrir se este é literal ou alegórico? E, o que fazer para não confundir interpretação com aplicação? Primeiramente, devemos saber que todo texto bíblico é literal, a menos que o contexto prove o contrário.

O que é contexto?
O contexto é formado pelos textos (versículos, capítulos ou livros) anteriores e posteriores à passagem em estudo, podendo ser imediato ou abrangente. Enquanto não ultrapassa o limite de um livro, o contexto é chamado de imediato.
No caso do texto áureo da Bíblia, João 3.16, o contexto imediato é formado por todos os versículos do capítulo ou, em uma análise mais ampla, por todos os capítulos do livro. Já o contexto abrangente pode ser remoto, englobando uma porção maior de passagens paralelas. Em resumo, o contexto da passagem em questão abarcaria: ou parte do capítulo, ou o capítulo todo, ou parte do livro, ou o livro todo, ou os quatro Evangelhos, ou todo o Novo Testamento, ou, em última análise, toda a Bíblia!

Os Dez Mandamentos

Um dos versículos mais citados pelos advogados da doutrina da maldição hereditária é Êxodo 20.5: “... sou Deus zeloso, que visito a maldade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem”. Recorrendo ao contexto imediato, descobrimos que essas palavras foram dirigidas exclusivamente aos israelitas (vv.1,2). Conquanto os próprios versículos do capítulo sejam suficientes para refutar a tal falsa doutrina, poderíamos lançar mão, ainda, do contexto abrangente (Ez 18.4,17,20; 2 Co 5.17).
Baseando-se no mesmo capítulo 20 de Êxodo, alguns teólogos ensinam que devemos guardar o sábado (v.8). Como já vimos, o contexto imediato mostra que o texto aplica-se ao povo de Israel. Ademais, se fizermos uma análise contextual abrangente, encontraremos duas fortes razões para não guardar o sábado:
1) O Antigo Testamento confirma que a guarda do sábado devia ser observada somente pelos israelitas (Êx 31.16; Dt 5.15; Ez 20.12-20). E isso, para eles, implicava realizar todos os rituais reservados para o dia de sábado, inclusive os holocaustos (Nm 28.9,10). Eles sabiam também que a guarda do sábado era apenas um dos muitos mandamentos contidos na lei (Gl 3.10).
2) No Novo Testamento, vemos que Cristo pôs fim à dispensação da lei e inaugurou o Tempo da Graça (Lc 16.16; Rm 10.4; Jo 1.17). Hoje, temos domínio sobre o sábado (Mc 2.27) e não precisamos guardar dias, meses e anos (Gl 4.9,10; Cl 2.16). Na atual dispensação, somos justificados pela fé em Cristo (At 13.39; Rm 3.20; Gl 2.16).
Exige-se, por conseguinte, de um bom intérprete das sagradas letras que ele seja, antes de tudo, um assíduo leitor da Palavra de Deus. Afinal, como poderá recorrer ao contexto remoto, se não conhecer a Bíblia de forma global? A leitura constante e seqüencial (livro por livro) faz com que o estudioso grave em sua mente um panorama geral dos acontecimentos bíblicos, facilitando a análise contextual.

Cuidado com a INTERPRETAÇÃO BÍBLICA!

A Bíblia tem sido muito mal utilizada em nossos dias...


Basta surgir uma manifestação ou inovações, que logo aparecem “teólogos” e “hermeneutas” apresentando textos supostamente comprobatórios de tais modismos. Há pregadores usando Gênesis 18.12 para defender a chamada “unção do riso”; Isaías 5.29 para afirmar que o crente pode “rugir como leão”; Amós 4.6 para tornar bíblico o fenômeno dos “dentes de ouro”, etc.
Para compreender e interpretar corretamente a Palavra de Deus é necessário, antes de tudo, ser um verdadeiro servo de Jesus, espiritual (1 Co 2.14-16). Entretanto, a despeito de este fator ser primordial para o entendimento das revelações do Senhor (Mt 13.11), a falta de conhecimento das regras básicas da exegese bíblica tem levado muitos ensinadores da atualidade a interpretações equivocadas, desprovidas de bases contextual, teológica e histórica. Evidencia-se, a cada dia, que obreiros sinceros, mas despreparados ou mal-informados, usam a Escritura como uma mera comprovadora de ensinamentos.
A Palavra de Deus alerta: “Sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação” (2 Pe 1.20). Nesta passagem, o apóstolo Pedro deixa claro que cada texto sagrado possui um único significado dentro do contexto.

Interpretação e aplicação

Antes de prosseguir, é importante diferençar interpretação de aplicação. A primeira visa a descobrir o único e verdadeiro significado de uma passagem bíblica, revelando o que o autor desejou transmitir. Já a aplicação é uma ênfase dada pelo pregador ou ensinador no momento da exposição bíblica. Segue-se que a aplicação não deve ser utilizada para a criação de doutrinas, pois não incorpora o verdadeiro significado de uma passagem.
O trecho de Lucas 10.25-37 nos oferece um bom exemplo. Na parábola em questão, Jesus enfatiza o amor para com o próximo, deixando claro o significado do texto: assim como o samaritano ajudou o homem atacado por salteadores, o cristão deve ter compaixão do próximo. Alguns pregadores, porém, dão a essa passagem outra denotação. Apresentam a parábola como uma representação da obra redentora de Jesus (o “Bom Samaritano”), fazendo, assim, uma aplicação diferente.
Ninguém está proibido de fazer aplicações bíblicas. Todavia, ao se valer dessa prática, o pregador precisa ter alguns cuidados. Em primeiro lugar, deve estar ciente de que está aplicando e não interpretando, pois muitos não sabem diferençar uma coisa da outra. Além disso, a aplicação deve ser feita de um modo que o público não a assimile como sendo a interpretação real da passagem.
Expoentes renomados costumam confundir aplicação com interpretação. Uma prática comum é a “espiritualização” de parábolas e de promessas ou mandamentos de ordem física dados exclusivamente ao povo de Israel, aplicando-os às situações de nossos dias. Tal recurso, conquanto seja válido na pregação, se torna perigoso por violar a intenção do autor, abrindo precedentes negativos no âmbito exegético.
Certo pregador, ao discorrer sobre o texto de João 15.1, usou uma aplicação no mínimo desastrosa. Segundo ele, uma vez que Cristo é a videira, e as videiras são parte da criação de Deus, segue-se que Cristo foi criado! Outro expositor, ao relatar a parábola dos dois filhos (Lc 15.11-32), concluiu que, como o filho mais novo se arrependeu e retornou à casa do pai sem o auxílio de um mediador, o homem não precisa de Jesus para se chegar a Deus!
Esses exemplos de aplicações infelizes nos levam a entender o quanto é importante saber que qualquer texto bíblico possui apenas uma significação. Se admitirmos que um trecho da Escritura Sagrada pode ter mais de um significado, franquearemos o caminho para todo o tipo de interpretação errônea. O objetivo do estudioso da Bíblia é entender a mensagem que o autor do livro, na época, quis transmitir àqueles a quem escreveu.